quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Donativos transfronteiriços

No dia 14 de Outubro de 2008 foram publicadas as conclusões do Advogado-Geral Paolo Mengozzi, proferidas no âmbito do processo C‑318/07 do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), que opõe o cidadão alemão H. Persche ao serviço fiscal de Lüdenscheid. Mais informação, na página do European Foundation Centre.

O Advogado-Geral considerou que os donativos efectuados por um nacional de um Estado‑Membro a uma instituição que tem a sua sede em outro Estado‑Membro, e que seja considerada de utilidade pública segundo o direito deste último Estado‑Membro, estão abrangidos pelas disposições relevantes do Tratado da Comunidade Europeia relativas à livre circulação de capitais. Deste modo, as leis nacionais que apenas reconhecem benefícios fiscais aos donativos feitos a instituições residentes poderão estar em contradição com o Tratado, por violação do princípio comunitário da não discriminação em função da nacionalidade.

Em causa está a questão de saber se "um donativo em espécie, concedido por um residente de um Estado‑Membro a uma instituição estrangeira considerada de utilidade pública no seu Estado‑Membro de origem, está abrangido pelas disposições do Tratado CE relativas à livre circulação de capitais e, sendo esse o caso, se o Estado‑Membro de residência do doador pode, sem desrespeitar o disposto nos artigos 56.° CE e 58.° CE, condicionar a dedução fiscal de tal donativo à condição de que seja feito a uma instituição situada no seu território".

Persche fez um donativo em espécie - roupas de cama e de banho, andarilhos e miniaturas de carros para crianças - a uma instituição portuguesa - Centro Popular de Lagoa -, num valor total de 18.180 euros, tendo pedido, em 2003, na sua declaração de rendimentos, a dedução deste valor a título de encargos especiais dedutíveis. O Finanzamt recusou a dedução solicitada, argumentando que o beneficiário do donativo não estava estabelecido na Alemanha e que o contribuinte não apresentou recibo desse donativo na forma prevista pelo Código Geral de Impostos alemão.

No caso da tese do Advogado-Geral Mengozzi ser acolhida pelo TJCE, o que poderá não acontecer, na medida em que a opinião não é vinculativa, a legislação portuguesa relativa ao mecenato - artigos 61 a 66.º do Estatuto dos benefícios Fiscais (EBF) - , por ausência de previsão, poderá estar igualmente a violar o Tratado da Comunidade Europeia.
Para um estudo mais detalhado sobre as implicações fiscais da filantropia ao nível internacional, recomenda-se a obra de Ineke A. Koele, "International Taxation of Philanthropy", de 2007. Para uma análise em português, ao nível do direito comunitário, recomenda-se a obra "As Fundações na Europa: aspectos jurídicos", coordenada por Rui Machete e Henrique Sousa Antunes, de 2008 e disponível on-line, bem como estudo "Fundações e Direito da União: perspectivas de evolução", de Emílio Rui Vilar, Presidente do Centro Português de Fundações, e Rui Hermenegildo Gonçalves, que integra o Vol. II dos Estudos Comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, de 2008.



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