quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Pensamento»Acção»Impacto

O Council on Foundations (COF) acaba de anunciar uma nova publicação electrónica, denominada Thought > Action > Impact. No primeiro número, dedicado à economia, o presidente do COF, Steve Gunderson, reconhece que a maior parte das fundações nos Estados-Unidos sofreu, ao longo do último ano, uma diminuição entre 30 a 45 % do seu valor e, nesta medida, em vez de estratégias de sobrevivência, apela a um compromisso com o progresso real num momento histórico da América.

Para ajudar as fundações neste período, o COF lançou uma plataforma de partilha de instrumentos e de recursos para lidar com a crise ecómica: Economic Xchange.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

3.ª Conferência da Associação Espanhola de Fundações

Discurso do Presidente da Direcção do Centro Português de Fundações na Sessão de Abertura da 3.ª Conferência da Associação Espanhola de Fundações:

A conjuntura actual
Foi-me pedido que abordasse o tema “As fundações na Europa: perspectivas para o futuro”. Parece-me que não posso evitar iniciar os meus comentários sem uma abordagem sucinta das consequências futuras da actual crise financeira, que constitui, de momento, a preocupação mais premente para o nosso sector.

Ao longo das últimas semanas tenho tido oportunidade de conversar e debater com muitos dos nossos colegas sobre a forma como as suas instituições têm enfrentado a crise e interpretado os seus sinais. Parece-me claro que, embora o impacto da crise tenha sido sentido em graus diferentes pelas várias organizações, as preocupações que lhe estão subjacentes mantêm-se. As fundações devem preparar-se agora para responder a uma questão essencial: como permanecer eficazes e relevantes enquanto enfrentam a depreciação dos seus patrimónios, vêem os seus rendimentos reduzir-se e têm de lidar com estratégias de emergência para a gestão dos seus activos e eventuais cortes orçamentais.

Sem querer subestimar a gravidade da situação financeira, acredito que as fundações são instituições duradouras e resistentes e que, apesar do período de dificuldade que vivemos, temos razões para alguma confiança. Um estudo recente publicado pelo Foundation Center[2] ilustra que, durante recessões anteriores, as fundações conseguiram, apesar de tudo, manter os seus orçamentos. Com efeito, as fundações demonstraram que, quando são mais necessárias, têm a capacidade necessária para ultrapassar os desafios que lhes são colocados. Apesar deste estudo se referir apenas à realidade dos Estados-Unidos, um inquérito preliminar realizado pelo European Foundation Centre (EFC) chegou a resultados igualmente positivos: cerca de 50% das fundações consultadas responderam que a crise financeira ainda não teve um impacto directo na sua gestão e 80% responderam que esperavam ser capazes de manter, em 2009, todos os seus compromissos.

Enquanto enfrentamos tempos difíceis é importante recordar que, enquanto sector, temos também um papel fundamental a desempenhar no tratamento das consequências da crise financeira. Gostaria por isso de sublinhar que, mais do que nunca, estando a passar por um período crítico, o movimento fundacional europeu deve aumentar a colaboração entre si, fortalecer a partilha de experiências e de conhecimento, e desenvolver uma voz mais coerente ao nível Europeu.

O acordo de colaboração celebrado no ano passado, em Évora, entre o Centro Português de Fundações e a Asociación Española de Fundaciones, por exemplo, constitui um exemplo feliz desta aproximação mais estruturada. Trata-se no fundo de definir uma visão comum para a cooperação entre as fundações portuguesas e espanholas, assumindo que integramos o mesmo eixo geopolítico e que, apesar das diferenças entre os dois universos fundacionais peninsulares, partilhamos ideias, desafios e objectivos.


Colaboração reforçada para a abordagem de problemas globais
Parece cada vez mais evidente que os problemas que uma fundação enfrenta num determinado contexto nacional não são radicalmente diferentes daqueles que são sentidos por outras fundações noutros contextos nacionais. À medida que o conceito do “local” é cada vez mais imbuído com considerações do “global”, as fundações europeias começam a forjar mais ligações com outras fundações, bem como com actores de outros sectores, quer na Europa quer fora dela. Estas novas realidades requerem, no entanto, um reequacionar dos métodos tradicionais.
Reconhecendo a importância dos desafios que as nossas sociedades actualmente enfrentam, a próxima Assembleia Geral e Conferência do EFC que terá lugar em Roma, em Maio de 2009, significará um regresso às questões básicas da filantropia, com o tema “Combate à Pobreza. Criando oportunidades”. Pretende-se debater como é que as fundações poderão, em conjunto, combater a pobreza de uma forma eficaz, tanto no quadro dos “Objectivos do Milénio”, como face aos efeitos da presente conjuntura. Outras questões como as migrações, as alterações climáticas, a saúde global ou a demografia requerem igualmente uma consideração num quadro transnacional.

Próximos passos na formação e orientação
A angariação de recursos financeiros em torno de projectos comuns constitui um exemplo tradicional de colaboração, mas em períodos instáveis e voláteis, é também importante que as fundações compreendam o potencial de outros recursos, incluindo o capital humano de que dispõem ou o incalculável valor do conhecimento e experiência que acumularam ao longo de sucessivos anos. Uma parte crucial do trabalho em conjunto traduz-se, por isso, em aprender mais com os outros através de exercícios de troca de experiências e de capacitação. Também o investimento na formação e motivação dos colaboradores é condição indispensável para o funcionamento de uma fundação segundo padrões exigentes.

A promoção do desenvolvimento do talento e da inovação dentro das próprias organizações permite às fundações obter o melhor dos seus colaboradores, conseguindo assim que a instituição preste um serviço de excelência às comunidades para as quais dirige as suas actividades. Tem sido observado, ironicamente, que as fundações investem menos nelas próprias do que aquilo que insistem que as organizações que apoiam invistam nos seus colaboradores e quadros directivos. Espero que esta tendência se altere e que as fundações europeias comecem assimilar o potencial da construção do talento e da excelência através da formação e da capacitação dos seus próprios recursos.

Desenvolvimento de uma voz colectiva ao nível Europeu
As condições financeiras podem ainda piorar antes de a tendência se inverter, pelo que agora é o momento oportuno para que as fundações actuem em conjunto e utilizem a sua voz colectiva para reivindicar melhorias ao nível do enquadramento fiscal e legal das suas actividades, designadamente junto da União Europeia.

O primeiro passo para alcançar um ambiente mais propício para as fundações independentes na Europa passa pela defesa do Estatuto de Fundação Europeia. Este Estatuto será um instrumento novo, opcional e de utilidade pública, que estará sujeito ao direito comunitário e que complementará os direitos nacionais. Esperemos que inclua igualmente a governação, a transparência e a “accountability” nas actividades transfronteiriças e transnacionais das fundações.

A necessidade de um estatuto desta natureza é ainda mais evidente quando verificamos que as fundações enfrentam diferentes leis nacionais e mesmo regionais ao mesmo tempo que novas iniciativas Europeias são menos eficazes pela falta de instrumentos legais apropriados. Infelizmente, apesar da doutrina defendida em vários casos pelo Tribunal de Justiça das Comunidades, as fundações enfrentam cada vez mais barreiras administrativas quando realizam actividades fora do território nacional. O consórcio responsável pelo estudo de viabilidade do Estatuto, que inclui o Max Planck Institute for International Private Law e o Centre for Social Investment da Universidade de Heidelberg, apresentará o relatório final à Comissão ainda este mês. Logo que o Comissário McCreevy tenha aprovado o estudo e este seja divulgado publicamente, as fundações serão convidadas a enviar à Comissão os seus comentários sobre o Estatuto. O EFC monitorizará o resultado deste processo, incluindo a análise do impacto e a proposta legislativa que deverá apresentada pela Comissão ainda em 2009 ou em 2010. Este esforço será inglório, no entanto, se não contar com um forte apoio por parte das fundações europeias.


Ainda ao nível do ambiente jurídico, o sector fundacional europeu deverá mobilizar-se em volta de um tratamento mais justo relativamente ao Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA). Com efeito, as fundações de utilidade pública estão sujeitas a um tratamento discriminatório relativamente ao IVA na medida em que são consideradas como consumidores finais, quando em verdade não o são. O EFC está neste momento a realizar um mapeamento entre os seus membros para averiguar quanto é que as fundações perdem anualmente em custos de IVA irrecuperáveis. Dos 17 resultados que recebemos até ao momento, quase 9 milhões de euros são anualmente perdidos em IVA. A Comissão Europeia está a considerar uma revisão da Directiva do IVA muito proximamente, e esperamos uma consulta sobre o tratamento das organizações de interesse público e as isenções de carácter social. Mais uma vez, o sector fundacional deverá responder com determinação e coerência a esta oportunidade.

Em conclusão, embora seja realístico pensar que o património das fundações se tenha desvalorizado nos últimos meses, não me parece que existam razões para entrar em pânico. Antes pelo contrário, as fundações devem surgir como um factor de serenidade e de bom senso. As fundações já enfrentaram crises similares no passado e conseguiram ultrapassá-las. A solução para este período de estabilidade passa necessariamente por um aumento da cooperação, pela aprendizagem recíproca e pela capacitação, bem como por uma voz mais forte ao nível Europeu. Eis um desafio que é também um dever.

Emílio Rui Vilar

[1] Miguel de Cervantes Saavedra, Don Quijote de la Mancha, Editorial Juventud, Barcelona, 1958, pág. 95.
[2] http://foundationcenter.org/gainknowledge/research/econ_outlook.html;jsessionid=2ILT212U0MQIHLAQBQ4CGW15AAAACI2F